Resumo:

A justificativa deste estudo parte do pressuposto que o desgaste físico e mental de um atleta pode levá-lo ao mau rendimento e até a desistência do esporte e as competições deixam de fazer parte de sua rotina. Assim, este estudo poderá ser relevante, na medida em que poderá apontar quais os fatores que podem influenciar a rejeição as competições e ao esporte. E com esses dados, estimular uma conscientização de professores ou treinadores há rever suas formas de ensinar ou treinar seus atletas e a não vê-los somente como um troféu e sim como uma criança ou adulto normal, como qualquer outro. Aliando a psicologia do esporte ao treinamento especifico e tático. E aos pais a verificarem até que ponto o esporte está sendo benéfico ao seu filho. Pois esses são os mais incentivadores a práticas esportivas.

Palavra chave: Burnout. Esportes. Estresse Psicológico.

1. Introdução

Sabe-se que os atletas em geral, dedicam anos de treinamento e privações, abdicando de muitas coisas na sua vida priorizando as quadras, tatames e pistas. Entretanto, a partir da experiência como atleta de Taekwondo, tenho percebido que, apesar da dedicação incondicional, as pressões provocadas pelas exigências do esporte competitivo levam muitos atletas ao desgaste físico e psicológico, ocasionando a desistência das competições.

Apesar de a duração da carreira de um atleta não ser muito longa, chega um momento que começam a surgir dúvidas quanto a dar continuidade a esta atividade, mas, será que essas dúvidas surgem perante um mau desempenho ou pelos obstáculos impostos pela falta de apoio ou ainda, a abdicação de algo que para indivíduos não atletas é normal como ir a festas, dormir tarde e acordar tarde. Ou por pressões de treinadores e da família.

É notável em atletas de alto nível, danosa conseqüência decorrente das pressões provocadas no contexto atual da prática desportiva que é de grande exigência. É comum o atleta exceder os seus limites, frente a quantidades demasiadas de treinamento, pressão, ansiedade e acúmulo de competições, aliados a intervalos insuficientes de recuperação, levando ao estresse. A síndrome de burnout, considerada uma reação ao estresse crônico, foi descoberta em profissões caracterizadas como de “serviços humanos”, casos de médicos, enfermeiros e advogados, expandindo-se, posteriormente, aos profissionais do âmbito esportivo.

Assim sendo, o objetivo dessa pesquisa consistiu-se em revisar conteúdos referentes à síndrome no ambiente esportivo e a partir dos seus modelos representativos teóricos. Foram analisados os aspectos históricos e a manifestações de burnout em atletas, sendo que para isto fez-se uma pesquisa bibliográfica, na literatura especializada na temática do estudo.

Sindrome de Burnout no esporte: Reflexões Teóricas

2. Sindrome de Burnout: Referencial Teórico

O termo burnout consiste em uma conjunção entre “burn” e “out”, ambas palavras da língua inglesa, onde a primeira significa “arder”, “queimar”, enquanto a segunda se refere a “fora”, “para fora” (MICHAELIS, 1989). Portanto, o significado literal para burnout em português é “queimar para fora”.

Porém, sua tradução é mais bem expressada pela palavra esgotamento. No entanto, devido ao fato de o burnout ter se firmado como um termo internacionalmente reconhecido na literatura científica optou-se pela manutenção da nomenclatura original.

Maslach e Jackson (1984, apud RAEDEKE 1997, p. 397) definiram burnout como “uma síndrome psicológica de exaustão emocional, despersonalização e reduzida realização profissional que pode ocorrer em indivíduos que trabalham com pessoas em alguma capacidade”.

De acordo com essa definição, o burnout é uma síndrome, ou seja, um conjunto de sintomas, e está fundamentado em três dimensões: a exaustão emocional (caracterizada por sentimentos de extrema fadiga); a despersonalização (sentimentos negativos com respeito aos clientes, sendo ilustrada por um comportamento impessoal, desligado e descuidado em relação aos mesmos) e, finalmente, a reduzida satisfação profissional (avaliações negativas sobre si mesmo, particularmente com referência à habilidade de obter sucesso no trabalho com clientes) (RAEDEKE 1997, p. 397).

O primeiro autor a descrever e conceituar a síndrome de burnout foi Freudenberger, em 1974 (GARCÍA UCHA, 2000; SOUZA e SILVA, 2002). Contudo, foram Maslach & Jackson que, ainda no final da década de 70 e início dos anos 80, elaboraram tanto um modelo teórico quanto um inventário para a mensuração da síndrome (SOUZA e SILVA, 2002).

O estresse é definido por Gould et al.(2001), numa perspectiva psicológica, como o indivíduo percebe um desequilíbrio entre demandas físicas ou psicológicas e seus recursos para enfrentamento do mesmo, em uma atividade considerada importante como, por exemplo, a ação esportiva o é para o atleta. O distresse, segundo Selye (2002), é um tipo de estresse que representa uma situação prejudicial para o organismo, podendo ser agudo quando é intenso, instalando-se em um breve período, ou crônico quando se instala gradativamente por um período mais longo.

Relativamente o estado de humor reflete nos resultados do treinamento fisico dos atletas se este atleta esta psiquicamente adoentado seu corpo não responderá da forma correta. Então a motivação esta fletida diretamente no desempenho dos atletas.

Em um estudo de William Morgan, Em 1980, psicólogo do esporte americano, que passou a utilizar o teste POMS, Profile of Mood States (Perfil dos Estados de Humor), na área de atividade física e do esporte para avaliar estados de humor em atletas americanos. Observou-se, através desses estudos, que o fator fadiga elevado equiparado ao fator depressão elevado, apresentado no gráfico individual do POMS, parece ser o produto do excesso de treinamento e que o teste pode detectar as alterações psicológicas que antecedem a síndrome, invertendo no gráfico o perfil iceberg. Partindo de uma análise epistemológica qualitativa, ou seja, da percepção do atleta quanto aos sinais psíquicos (alteração de humor, depressão, ansiedade) e físicos (fadiga, cansaço, etc.), essa medida tem sido, desde então, bastante efetiva e sensível em quantificar o distresse associado ao overtraining em pesquisas com atletas.

3. Burnout: Primeiros Estudos

Inicialmente, o burnout foi diagnosticado em indivíduos pertencentes às chamadas profissões de ajuda (“helping professions”). Advogados, professores, assistentes sociais, dentistas, enfermeiros e médicos são exemplos desse tipo de profissões, que se caracterizam por constantes relações interpessoais, bem como pela necessidade do profissional em promover avanços de ordem biológica, psicológica, social, intelectual e/ou financeira em seu cliente/paciente/aluno.

Os estudos mais recentes acerca da síndrome de burnout mantêm seu foco nas profissões de ajuda. Assim sendo, os profissionais da área de saúde, de modo particular, constituem-se no grupo de indivíduos mais analisados em relação ao burnout sob o olhar da ciência psicológica.

Como se observou ao longo do levantamento de registros literários, a preocupação com o burnout no ambiente organizacional atinge proporções globalizadas. Na região de Guadalajara (México), MARTÍNEZ (1997) buscou traçar um perfil de risco para a incidência da síndrome entre os profissionais pertencentes a centros de atenção primária e especializada de saúde.

De acordo com as variáveis abordadas, o perfil de risco epidemiológico obtido foi o seguinte: sexo feminino; idade acima de 44 anos; ausência de conjugue estável; mais de 19 anos de profissão e mais de 11 anos no referido local de trabalho; lotação em serviço especializado com mais de 21 pacientes sob sua responsabilidade; mais de 70% da carga horária diária dedicada a esses pacientes e, por último, jornada semanal de 36 a 40 horas.

No Brasil, SOUZA e SILVA (2002) elaboraram um estudo a respeito do burnout em profissionais de saúde, porém relacionando-o com fatores de personalidade e de organização no trabalho. Nesse estudo, concluiu-se que o padrão de personalidade com estilo de vida caracterizado, entre outros fatores, por extremo senso de urgência, raiva, irritação, ambição e agressividade, mostrou-se um preditor significativo do burnout total, bem como de suas dimensões exaustão emocional e despersonalização.

As variáveis traço de ansiedade (preocupação referente à determinada situação específica) e suporte de chefia (percepção do sujeito quanto à orientação recebida para a realização das suas tarefas) também se apresentaram preditores significativos do burnout, exaustão emocional e despersonalização.

Conforme observado, o burnout na área organizacional pode ser considerado um campo de pesquisa em ampla expansão na comunidade científica em geral e entre os profissionais de psicologia do trabalho de modo específico.

Sindrome de Burnout no esporte: Reflexões Teóricas

4. Modelos Teóricos

O modelo proposto por Smith (1986, p.37) é conhecido como Cognitivo-Afetivo. Para esse autor, o burnout “é uma reação ao estresse crônico”. Conforme seu ponto de vista, a síndrome possui componentes físicos, mentais e comportamentais, apresentando como característica mais marcante a saturação psicológica, emocional e, por vezes, física de uma atividade anteriormente agradável e procurada.

O autor recorre ao Modelo da Permuta Social de Thibaut e Kelley (1959, apud SMITH, 1986) com o intuito de diferenciar o abandono das modalidades esportivas pelos atletas devido ao burnout daqueles motivados por outros aspectos.

De acordo com esse modelo, nos casos em que o atleta abandona sua modalidade em virtude de interesses por outras atividades sociais ou, até mesmo, por outro esporte, tal abandono não se constitui a partir do burnout. Já no caso da síndrome, há uma elevação do estresse gerado através dos treinos e competições. Como as recompensas (satisfação, alcance de metas, prestígio social, ganhos financeiros) proporcionadas pelo esporte permanecem no mesmo patamar, o atleta comumente faz a opção pela interrupção da carreira esportiva competitiva (SMITH, 1986).

O modelo teórico de Coakley (1992) possui uma perspectiva claramente social. O burnout, conforme esse modelo surge como conseqüência de uma estrutura social que associa a identidade e a dimensão do “eu” do atleta exclusivamente à modalidade esportiva que ele pratica. Portanto, somente com a aquisição de novas vivências o esportista tem a possibilidade de prevenção ou reversão do quadro de burnout. Para que isso aconteça, faz-se necessária uma transformação do cenário social do esporte atual.

Já o modelo de Silva (1990, apud GOULD et al., 1996a), recebe a denominação de Modelo de Resposta Negativa ao Estresse de Treinamento (SILVA 1990, apud GOULD et al., 1996a). Nesse referencial teórico, é dada mais ênfase à valência física do treinamento, seguindo um contínuo de adaptações negativas que se inicia com o “staleness”, passando pelo “overtraining” e se encerrando com o burnout (GOULD et al., 1996a, p. 325). Esse então se inicia com o esgotamento físico e por fim o mental.

5. Burnout no esporte – Histórico

No esporte, sempre se ouviu falar em desistências de atletas ou quedas de rendimento, mas muito pouco ou quase nada se ouviu dizer a respeito dos motivos que conduziram a esse inesperado acontecimento. O que o levou a isso. Antes dessa desistência o atleta se sente esgotado tanto no aspecto físico, quanto psíquico e social. A esse esgotamento da atividade em questão chamamos de síndrome de burnout.

Após sua identificação nas profissões de ajuda, o burnout passou a ser percebido também no meio do esporte e da Educação Física. De acordo com Garcés de Los Fayos e Vives (2002), os estudos direcionados à área do esporte começaram há pouco mais de 20 anos.

A partir desse momento, foi observado que profissionais como os professores de Educação Física, treinadores, preparadores físicos, atletas e árbitros se constituíam em indivíduos propensos à aquisição dessa síndrome.

Tal propensão se desenvolve à medida que os profissionais da área lidam com constantes relações interpessoais, sejam elas com os alunos, diretores de escola, membros de suas equipes técnicas, equipe de arbitragem, dirigentes, imprensa, amigos ou familiares. Juntamente com essas relações, são vivenciadas percepções de cobranças, críticas, cansaço e estresse.

Devido a essa realidade, já é possível encontrar na literatura científica estudos envolvendo grande parte das profissões citadas anteriormente. Através dos modelos teóricos, foram desenvolvidas abordagens referentes ao burnout no âmbito esportivo. Três dos principais modelos descritos na literatura aparecerão descritos a seguir.

Na literatura científica internacional, desportistas de variadas modalidades já foram analisados em relação às manifestações de burnout. No golfe, Cohn (1990) entrevistou 10 escolares competitivos. Após classificar em temas as respostas dos mesmos, verificou que as causas de burnout citadas com maior freqüência foram o excesso de treinos e jogos, a ausência de alegria e satisfação e, por último, o excesso de cobrança de bom desempenho oriunda de si próprio, do treinador e dos pais.

No tênis de quadra, Gould et al. (1996a) compararam 30 atletas da categoria júnior vitimados pela síndrome com 32 tenistas-controle. Alguns dos resultados com diferenças significativas apontaram, para os tenistas com burnout, menores índices de foco no treino, motivação externa, interpretação positiva e estratégias de “coping” (enfrentamento), além de maiores índices de desmotivação e desejo de abandono esportivo.

Em outra pesquisa complementar, os mesmos autores (GOULD et al., 1996b) diagnosticaram sintomas mentais e físicos em 10 tenistas. Encontravam-se entre os sintomas psicológicos os seguintes itens: baixa motivação/energia, sentimentos e afetividade negativos, sentimento de isolamento, problemas de concentração, instabilidade emocional e, contraditoriamente, motivação para competir, porém não necessariamente para treinar.

Quanto aos sintomas físicos, foram mencionadas lesões, doenças, fadiga e cansaço. Percebendo o burnout como um fenômeno atual e pertinente entre os esportistas, Garcés de Los Fayos e Medina (2002) elaboraram princípios básicos a serem aplicados em programas de prevenção e intervenção.

Na prevenção, são necessárias medidas como estruturação racional do treinamento, aplicação de treinamento psicológico e aumento da idade mínima para participação em competições profissionais.

No âmbito da intervenção, os autores julgam relevante avaliar os impactos da síndrome na vida pessoal, esportiva e familiar-social dos atletas, assim como sincronizar o relacionamento do psicólogo do esporte com os esportistas afetados.

Sindrome de Burnout no esporte: Reflexões Teóricas

6. Causas e Consequências do Burnout em atletas

Verkhoshanski (2001), no início da década de 90, apontava para aspectos daquele momento de desenvolvimento do esporte, que já significavam problemas e desafios a serem superados, e que deram origem a novas compreensões de processos de preparação, culminando com procedimentos apoiados pela precisão do acompanhamento tecnológico e de métodos de alta exigência. Elenca o autor:

1) O constante aumento dos níveis de resultados esportivos, que obriga técnicos e atletas a explorarem cada vez mais os limites de rendimento do alto nível de exigência, refletindo no processo metodológico-organizativo;

2) A tensão provocada pela obtenção dos resultados e o aumento do número de atletas que conseguem resultados de altíssimo nível, aumentando a qualidade, estabilidade e desempenho nos aspectos da técnica e da tática, bem como das capacidades inter e intrapessoais;

3) A dificuldade de aumentar o nível de intensidade das preparações, exigindo exploração constante dos itens que podem significar o aumento da eficácia do treinamento físico especial;

4) O incremento constante do volume de treinamento, provocando o aparecimento do problema da investigação das relações mais eficazes entre as cargas de diferente orientação fisiologia especial, e das combinações nos ciclos de preparação, dessas cargas;

5) A importância da ciência nos processos de treinamento, pois devido ao elevado nível de exigência em treinamentos e seqüência de competições, em alto nível de qualidade de desempenho de seus participantes, os atletas estão sendo exigidos em seus sistemas funcionais de alta relevância, necessitando de conhecimentos científicos.

As causas do burnout estão relacionadas principalmente às dificuldades de relacionamento com o treinador, altas demandas competitivas, monotonia dos treinamentos, falta de habilidades esportivas, decepção das expectativas iniciais com os resultados finais obtidos, interesses financeiros dos pais, ausência ou reduzida vida pessoal fora do esporte, falta de apoio de familiares e amigos, excessivas demandas de energia e tempo, sentimento de isolamento frente à equipe técnica e, finalmente, carência de reforços positivos pelos resultados conseguidos (GARCÉS DE LOS FAYOS; VIVES,2002).

Por outro lado, as conseqüências da síndrome atingem a dimensão física, gerando redução dos níveis de energia e aumento da suscetibilidade tanto a doenças quanto a distúrbios do sono; a dimensão comportamental, originando sentimentos de depressão, abandono e raiva (SMITH, 1986); e a dimensão cognitiva, provocando percepções de sobrecarga, abandono e baixa realização, juntamente com o tédio (FENDER, 1989).

Smith (1986) afirma que a síndrome do burnout é mais freqüente em atletas de esportes individuais, por serem mais competitivos, de alta exigência física e psicológica, devido à natureza repetitiva e monótona dos treinamentos, além de menor suporte social dos companheiros de treinamento.

De Rose (2001) fez um estudo de estresse com adolescentes nas seguintes modalidades esportivas: basquetebol, futebol, natação e tênis, verificando que as meninas apresentam níveis de estresse significativamente maiores que os meninos. De Rose (2001) afirma, com base nesse estudo, que entre todas as modalidades esportivas estudadas, o tênis foi a que apresentou maior nível de estresse. Um caso notável de burnout no esporte em um brasileiro foi o do ex-tenista Marcelo Saliola, considerado como um talento.

Especialistas o compararam com o americano Jimmy Connors, o número 1 do mundo nos anos 70. Mesmo com tudo a favor, sua carreira se desenvolveu em outra direção, inesperada pelos que o acompanhavam. Em reportagem publicada pela revista Veja, em 17 de dezembro de 2003, aparece a notícia: “Na semana passada, “Saliolinha do Brasil”, como era chamado, falava para uma tímida platéia em uma academia de São Paulo. Aos 29 anos, ele discorria sobre a dura rotina de treinamentos, a insuportável pressão paterna e a atração por noitadas e garotas, fatores que o levaram a abandonar a carreira no auge. Diz o tenista: “parei por razões psicológicas e emocionais. O tênis tinha se tornado uma tortura, um massacre, a pior coisa da minha vida”.”

O Burnout é encontrado também nos técnicos. Um estudo de Weinber & Gould (2001) relatam a síndrome em técnicos do esporte profissional, professores de academia, administradores e professores de educação física. Em relatos, trazem exemplos de vários técnicos que interromperam momentaneamente a carreira para controlar as pressões que sofriam, como o caso de um técnico olímpico de basquetebol. Eis alguns exemplos da fala, de alguns destes técnicos: “Não quero que isto soe como se eu estivesse comparando o que eu faço com guerra, porque não estou. Mas este trabalho é um pouco como foi para os soldados no Vietnã. Se você não tiver cuidado, ele poderá transformá-lo em outra pessoa, alguém que você não quer ser”, citado em Weinberg & Gould (2001, p. 465).

Outro depoimento de técnico da Liga Profissional de Basquetebol dos Estados Unidos da América aponta para características do burnout: “Penso nas tantas maneiras com que às vezes você tem que se comprometer – valores de técnico e filosofia de treinamento – apenas para acomodar pessoas e fazer as coisas funcionarem. E esta é a coisa mais inflexível nisso tudo, a tendência deste emprego de mudá-lo e você perder o controle disso”, citado em Weinberg & Gould, (2001, p. 465).

O burnout no esporte se desenvolve como conseqüência ou manifestação de um estresse excessivo e crônico. A queda de rendimento pode ser um sinal de que o atleta está sendo vitima da síndrome em sua fase inicial e isso agrava ainda mais a pressão sobre o mesmo. Muitas vezes ele precisa vencer para continuar a competir ou precisa realizar a jogada correta, porém a impossibilidade de concretizá-la só aumenta a tensão, os resultados positivos não aparecem, seu rendimento começa a cair, seus treinos passam a ser desmotivantes e instala-se a síndrome do burnout. Assim como aconteceu com Saliola, essa situação começa a se repetir desenfreadamente e como resultado final ocorre a completa desistência.

Pressões externas também podem ser determinantes na vida de um atleta. A exigência de vitórias por parte de treinadores ou pais, as comparações entre irmãos ou até mesmo feitas com jogadores melhores no mesmo grupo, cobranças acerca da perfeição, tudo isso contribui para o surgimento da síndrome de burnout. A conseqüência é que o atleta deixa de jogar por prazer, caracterizando-se o jogo pela busca da vitória, é o vencer a qualquer custo. Se ornando uma obrigação. Na busca pelos causadores desta pressão sobre o atleta, é comum achar os culpados mais diretos. Está a condição instalada desde o senso comum que dirigentes esportivos e comissão técnica cobram dos atletas somente a vitória, e desconsideram que o mesmo pode estar sendo afetado por perturbações de caráter físico e psicológico. Desta maneira, os atletas acabam esquecendo do prazer de treinos e competições, que um dia os fizeram iniciar a prática esportiva. A importância da competição e da obtenção da vitória se sobrepõe à necessidade de obter prazer praticando esporte. A mídia também é uma grande influenciadora, pois por alguns momentos faz um atleta um ídolo e quando o atleta esta numa fase ruim ou perde alguma competição a midia desaparece, pois o atleta se torna inútil para ela passa a ignorar existência deste. Um dia você possui tudo, convites para eventos, cachês altos, programas de televisão. E no outro dia o atleta não possui mais nada disso.

O excesso de treinamento e o excesso de competições podem também prejudicar a vida social do atleta. Pelo compromisso com as atividades da vida esportiva profissional, passa a não ter mais tempo para o convívio com os amigos ou para outras atividades que lhe dão prazer. Perde vida social e isso implica, para os atletas mais jovens, em um fim precoce da infância e da juventude, com um acúmulo de responsabilidades que, na maioria das vezes, ele ainda não está preparado para enfrentar e que efetivamente pertencem ao mundo dos adultos. Esse contexto determinaria uma das causas do desenvolvimento do processo de burnout.

Para Smith (1986) o burnout envolve uma fuga psicológica, emocional e, algumas vezes, física de atos prazerosos em resposta a um excessivo nível de estresse ou insatisfação. Ausência do prazer e valorização da performance são as principais mudanças apresentadas, que resultam em estresse prolongado, levando, muitas vezes, ao esgotamento por parte do atleta (GOULD et. al. 1997).

No esporte profissional é fundamental buscar a excelência. Não se pode permitir a ocorrência dos males que retardam ou interrompem a vida profissional de um atleta, pois a mesma deve ser duradoura e saudável. As atenções também devem estar voltadas às pessoas que praticam algum esporte como forma de evitar uma vida sedentária, já que não podem ser atropeladas por tais males uma vez que também buscam uma melhor qualidade de vida.

A síndrome de burnout também vem recebendo seu devido tratamento na esfera legal. As leis brasileiras já reconhecem a síndrome de burnout como um agente causador de doenças profissionais ou doenças do trabalho.

No decreto nº 3.048/99, de 6 de maio de 1999, que dispõe sobre o Regulamento da Previdência Social, em seu Anexo II, que trata dos agentes patogênicos causadores de doenças profissionais ou do trabalho, conforme previsto no artigo 20 da Lei 8.213/91, fala em transtornos mentais e do comportamento relacionados com o trabalho (Grupo V da CID-10), no inciso XII relata na sensação de estar acabado (“Síndrome de Burn-out”, “Síndrome de Esgotamento Profissional”) (Z73.0).

A síndrome de burnout, presente no mundo dos esportes, pode ser considerada como um dos fatores limitadores no desenvolvimento de atletas, principalmente de jovens atletas. É muito comum atletas, quando atingem o nível profissional, desistirem do esporte, abandonarem a carreira esportiva. O nível de exigência e tão alto que se um atleta não tiver um acompanhamento psicológico ele não sobrevive.

A supervalorização da vitória pode induzir a outro acontecimento: o excesso de treinamento. De acordo com Jones e Hardy (1990) o desempenho competitivo depende da combinação de três fatores: fisiológicos, técnicos e psicológicos. Entre os fatores psicológicos, o estresse é um dos mais importantes e, às vezes, é aquele que determina o sucesso do desempenho. O treinamento desportivo realizado continuamente sugere estímulos permanentes, proporcionando sucessivas adaptações psicofisiológicas do organismo humano. Essas adaptações são positivas, pois fortalecem o organismo física e psiquicamente para enfrentar exigências cada vez mais rigorosas.

A relação entre estímulo, reações e adaptações do organismo é representada pelo estresse. No entanto o estresse físico excessivo tem suas conseqüências, que nem sempre são positivas. O excesso de estresse físico pode dar origem ao sobretreinamento, que segundo Gould et al. (1997), pode também ser um precursor da síndrome do burnout.

Segundo HELLSTEDT (1995:117) As interferências inter-relações sociais também são aspectos fundamentais para o estabelecimento de um ambiente em condições favoráveis para o processo de formação do atleta. Pois é em casa que o jovem desenvolve sua identidade e isso ira refletir na sua carreira esportiva. A carreira bem sucedida de um atleta pode refletir da conduta da família para com este, o encorajamento da família, aquisição de valores, alem do amor e suporte necessário durante toda a carreira.

Infelizmente a família pode ter interferências negativas na carreira de um atleta. A alta exigência, a cobrança dos pais, as comparações desnecessárias, podem causar expectativas irreais, causando a frustração no atleta.

Concluindo, o burnout em atletas origina-se de modo mais marcante a partir da incompatibilidade dos planos e metas iniciais dos mesmos na modalidade esportiva com as demandas crônicas de cunho sócio-psico-físico do próprio esporte, podendo ocasionar, como uma das características mais relevantes, o abandono precoce da modalidade pelo esportista.

Sindrome de Burnout no esporte: Reflexões Teóricas

7. Modelos de Mensuração no esporte

Assim como acontece com as pesquisas envolvendo as demais profissões, o meio esportivo também se utiliza quase que exclusivamente do MBI e de outros inventários generalistas como instrumentos de identificação e mensuração de Burnout em indivíduos.

Ao estudar a síndrome em treinadores, García Ucha (2000), por exemplo, trabalhou com o Inventário de Potencial de Burnout de Potter, um modelo genérico de mensuração. Buscando a evolução nesse sentido, um teste que procurou respeitar as características do contexto esportivo foi o Inventário de Burnout para Árbitros, desenvolvido por Weinberg e Richardson (1990).

Tal instrumento, entretanto, configura-se como uma adaptação do MBI, sendo que os termos genéricos foram substituídos por palavras inerentes à profissão de árbitro. Garcés de Los Fayos (1999, apud GARCÉS DE LOS FAYOS; MEDINA, 2002) também realizou uma adaptação do MBI, porém para aplicação em esportistas, considerando-o como o principal método de avaliação dessa síndrome em atletas.

Um instrumento de identificação e mensuração da síndrome de burnout que contempla a validação ecológica para o ambiente esportivo, mais especificamente para a realidade dos atletas, intitula-se Athlete Burnout Questionnaire” (ABQ) (RAEDEKE; SMITH, 2001), cuja tradução apropriada para a língua portuguesa significa “Questionário de Burnout para Atletas” (QBA).

A versão definitiva do ABQ contempla três dimensões ou construtos de burnout: reduzido senso de realização, exaustão física/emocional e desvalorização da modalidade esportiva. Tais construtos foram definidos por Raedeke (1997), ao considerá-los relevantes para o âmbito esportivo, substituindo, portanto, despersonalização, reconhecidamente importante para o meio das profissões de ajuda, pela desvalorização.

8. Considerações finais

O presente estudo teve como principal objetivo revisar os conteúdos literários referentes à síndrome de burnout com relação ao esporte. O Burnout é visto como uma resposta psicofisiológica exaustiva resultante de freqüente e, algumas vezes extremo, porém, ineficaz esforço proveniente de demandas excessivas de treinamento e de competição. O Burnout envolve aspectos psicológicos, emocionais e, em muitos casos, a desistência de uma atividade em resposta ao stress excessivo ou a falta de satisfação.

Nesse sentido, esta síndrome caracteriza-se por uma reação ao stress crônico e o seu desenvolvimento representa uma complexa interação entre ambiente e características pessoais.O burnout esta presente também entre os técnicos. E é por isso que Kelley afirma que os técnicos precisam ser encorajados a olhar para suas próprias necessidades e evitar um envolvimento demasiado com a vida de seus atletas. Saber separar essas duas vidas.Os atletas por sua vez precisam ser encorajados a se tornarem menos dependentes mais autônomos em suas decisões. Atletas são seres humanos com sentimentos, desejos, necessidades e sonhos e não maquinas esportiva.

Chiminazzo (2005) aponta que uma busca na literatura revela que são diversos os motivos que podem levar um atleta ao esgotamento e conseqüentemente a desistência da prática esportiva, como por exemplo, a estafa, o sobretreinamento, entre outros. Mas esses fenômenos não se confundem com a síndrome de burnout.

Existe uma confusão na literatura sobre os conceitos e definições desses fenômenos, porém é necessário notar que a origem de cada um deles pode poder diferenciá-los. Também é necessário tomar cuidado para não fazer idéia de que tudo que possa estar ocorrendo com um atleta seja burnout. Alguns atletas deixam a prática esportiva, pois têm como objetivo de vida uma outra atividade e isso não representa a síndrome de burnout.

Por isso é imprescindível que profissionais da Educação Física e do esporte, aliados aos conhecimentos da Psicologia, saibam o que é a síndrome de burnout, como identificá-la e que assim possam saber lidar com ela durante suas atuações. Saber definir a síndrome dos demais males que possam afetar a vida de um atleta, também é competência do profissional da Educação Física.

Finalmente, é possível afirmar que a síndrome de burnout no meio esportivo constitui-se em um tema tanto abrangente quanto inesgotável.

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Débora Fernanda da Silva Nunes
Atleta Olimpica da Seleção Nacional Brasileira de Taekwondo Beijing 2008